O machismo tem várias facetas. Aquele explícito não está mais na moda, mas ainda acontece. A barbaridade de bater na mulher porque ela saiu de casa com as amigas ou forçá-la a ter uma relação sexual quando ela não quer, encontra-se nas camadas mais baixas da consciência social. Vinte anos atrás, o pai de um menino de sete anos que eu tratava, sentou-se na minha frente e disse: “Para mim, as mulheres valem da cintura para baixo.” Era sua primeira sessão, após um ano ele não era omesmo homem, mas também não havia mudado muito, tanto é que retirou o filho da terapia quando este parou de ser violento e começou a ser capaz de se relacionar e conversar.
Apesar do nível educacional do homem não necessariamente corresponder à sua evolução como indivíduo humano, as mudanças na sociedade às quais ele está sujeito pelo simples fato de trabalho, levam-no a modificar sua relação com as mulheres em geral. Elas tem sempre mais espaço e poder social, são colegas e chefas, estão na televisão e nos órgãos de governo. Tornou-se complicado praticar o machismo explícito, e também muitos homens não acreditam mais nele. Nem por isso, chegamos à idade de ouro das relações de gênero.
Se o homem não pode mais bater na mulher, ele pode fazer pirraças. Ela saiu com as amigas? No dia seguinte ele inventa uma atividade para si mesmo. Ela não dá o que ele espera? Ele encontra uma forma para fazê-la “pagar”. Há sempre um modo para sabotar, cutucar e perturbar os planos e expectativas dela.
O machismo explícito como o pirracento remetem à mesma raíz: ambos são infantis. Um usa a força para impor sua vontade, o outro a pirraça. Entre medo, sentimento de culpa e busca pela harmonia doméstica as mulheres tendem a deixarem-se dobrar.
Uma terceira face do machismo é o estilo “enrustido”. O homem governado por esta perspectiva superou aquele tipo de dependência da mulher que o deixa inseguro todas as vezes em que sente estar perdendo o controle sobre os movimentos dela. Ele absorveu algumas necessidades humanas, do tipo: respeito, liberdade de expressão e de movimento. Reconheceu na mulher uma individualidade diferente com suas próprias legítimas exigências. Mas o que acontece se ela for mais inteligente do que ele? Ou mais culta? Ou ganhar mais?
Para o machista enrustido, a disputa pelo poder continua não no plano físico, mas naquele mental e intelectual. É bastante normal uma mulher aprender com seu homem, ele lhe explicar alguma coisa, abrir-lhe horizonte, levá-la para novos lugares reais e metafóricos. Mas será que ele aceita o mesmo? Sente-se ele à vontade para ter uma troca honesta e harmoniosa com ela, onde a reciprocidade é um fato e não um termo vago? Mulheres mestras, gurus, intelectuais podem ser reconhecidas e apreciadas sem tirar nada à identidade masculina do homem, mas o mesmo acontece raramente com a mulher com quem vive e dorme.
Enfim, há o machismo necessário. Entre o amor e o respeito pela mulher, a admiração, o reconhecimento pelo valor, o aprendizado com ela, até a proteção e exaltação dela…. O que sobra para os homens? Onde fica a identidade masculina? O homem que está disposto a aprender com a mulher, e até a segui-la (!) lá onde ela conhece o caminho melhor do que ele, esse homem que ama as mulheres mas que não quer sentir-se esmagado pela fulgorante visão dessa nova mulher mil marvilhas… o que pode fazer para preservar-se sem voltar ao machismo?
Bem diziam os estudos de psicanálise da primeira infância que a construção da identidade masculina é mais complicada para o menino do que para a menina, que distingue-se da mãe mas é ela mesma mulher. O homem moderno, que tem, geralmente, exemplos masculinos falhos em seus pais ou que simplesmente não quer ser como ele, e que, por outro lado, não está confortável em transformar sua mulher numa mãe à qual obedecer, onde encontra esse homem modelos de referência? O que é ser homem afinal?
Nesses tempos de transição e crise, tem-se a impressão que, caindo a armadura do machismo, todos vão poder ver que “o Rei está nu”.
fonte:http://www.psicologiadialetica.com/2010/06/faces-do-machismos-explicito-pirracento.html
Nenhum comentário:
Postar um comentário